"Você quer viver ou quer morrer?"
Cinema de gênero é algo complicado de ser realizado. Se for aqui no Brasil, pior ainda. Mas os diretores Kléber Mendonça e Juliano Dornelles provam que isso é possível em BACURAU.
Pouco após a morte de dona Carmelita, aos 94 anos, os moradores de um pequeno povoado localizado no sertão brasileiro, chamado Bacurau, descobrem que a comunidade não consta mais em qualquer mapa. Aos poucos, percebem algo estranho na região: enquanto drones passeiam pelos céus, estrangeiros chegam à cidade pela primeira vez. Quando carros se tornam vítimas de tiros e cadáveres começam a aparecer, Teresa (Bárbara Colen), Domingas (Sônia Braga), Acácio (Thomas Aquino), Plínio (Wilson Rabelo), Lunga (Silvero Pereira) e outros habitantes chegam à conclusão de que estão sendo atacados. Falta identificar o inimigo e criar coletivamente um meio de defesa.
Quem acompanha o MellonCast sabe o quanto nós aqui do blog reclamamos do cinema nacional, principalmente quando ele tenta emular fórmulas ou gêneros que nós estamos mais acostumados a ver no cinema de Hollywood. Bacurau consegue se destacar em ser um filme que bebe de diversas fontes “gringas”, mas sem deixar a nossa identidade de lado. Basicamente, Bacurau é um Neo-Western em um “futuro não tão distante”. O roteiro do filme é magistral, já que ele vai te dando pequenas informações sobre o que está acontecendo naquela realidade e no pequeno povoado de Bacurau. É uma história que te prende e que te faz perguntar o que está acontecendo com aquela comunidade. E vai te dando várias pistas (verdadeiras e falsas) que te jogam em várias possibilidades. Você acha que pode ter algo realmente especial, mas a realidade dura e crua vem para te dar um soco na cara no final. E não é aquele filme com diálogos de exposição preguiçosos. Aqui você precisa ir pegando as pequenas deixas do roteiro. Só por isso o filme já se destaca das produções atuais, sejam elas nacionais ou internacionais.
É impossível não traçar um paralelo com o momento atual do país na política internacional. Em um momento que vemos a soberania do país sendo atacada em temas delicados como o da Amazônia e uma relação... digamos bastante “vira-lata” com os EUA, Bacurau acerta em cheio em sua crítica política. Sim, esta terra é saqueada e vilipendiada desde o seu “descobrimento” pelos portugueses, mas aqui temos quase que uma “vingança” proposta pelos diretores e roteiristas. Uma vingança que invoca tradições históricas do Nordeste, em um contexto que continua muito atual. O filme aproveita muito bem uma certa proximidade do cangaço com a vida do velho oeste americano. Acho que são duas culturas bem parecidas, e aqui são muito bem exploradas.
A fotografia do filme é espetacular! Várias tomadas que remetem aos filmes de faroeste clássicos. Tudo isso com alinhado com ótimas atuações do elenco. Sônia Braga e o alemão Udo Kier são os grandes destaques. Outra sacada foi o uso da faixa “Night” do diretor, roteirista, compositor e lenda do cinema, John Carpenter. É um tema que caiu muito bem para o filme e dá o tom certo para o início do ato final do filme.
Bacurau é uma obra prima do cinema nacional recente. É uma prova que podemos fazer cinema de gênero sem ser uma cópia barata ou pastiche do cinema Hollywood. O filme também prova que você pode fazer uma crítica política ser tão óbvia ou forçada. Um filme necessário e que vem uma hora que o cinema brasileiro REALMENTE precisa se provar.
NOTA: 10
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