terça-feira, 18 de outubro de 2016

O DEMÔNIO DE NEON

Semanas depois de ver o filme, uma crítica um pouco diferente do que tem por aí na Internet, sobre o novo e polêmico filme de Nicolas Winding Refn.


[SEM SPOILERS]

Se você cogitou assistir o Demônio de Neon (The Neon Demon), deve ter pesquisado umas críticas por aí e pode ter ficado dividido. A maioria achou o filme fraco, decepcionante e bizarro. Se você vai pela maioria, não perca seu tempo vendo o filme. Você não vai gostar. Sério.

Primeiro, que a história simples de uma garotinha do interior que tenta ser modelo na cidade onde os anjos não têm vez (também conhecida como Los Angeles) e é vítima da inveja e frustração de três mulheres que querem possuir sua beleza a qualquer custo, não é um filme de terror propriamente dito. Não como os que você pode estar acostumado. Segundo, que o ritmo lento do filme (como quase todos os outros do diretor), pode deixar você com sono. “Que filme chato!”, você irá dizer, acredite.

Claro, o filme tem Christina Hendricks e Keanu Reeves fazendo pontas, tem um visual bonito e trilha moderna, além de belas mulheres, algumas delas nuas. Tem cena de sexo, também. E sangue. Mas, se você procura um filme em que a mocinha corre do vilão que quer matá-la e é salva no final, esqueça. Gaste sua pipoca com outro filme.

Porém, se você curte filmes diferentes, “artísticos”, cult, polêmicos e controversos, pode ser que goste. Pode ser...

Se o único filme de Stanley Kubrick que assistiu foi Laranja Mecânica, ou se achou O Iluminado sem pé nem cabeça, 2001 e Barry Lyndon maçantes e De Olhos Bem Fechados apelativo, esquece. Se espera ver cenas fortes de polêmica gratuita, como em Ninfomaníaca, Love, O Anticristo ou Serbian Film, também esqueça. Procura por filmes com críticas sociais, políticas e filosóficas batidas, populares nas rodas de bar da Rua Augusta? Deixa quieto.


O Demônio de Neon é, como você já deve ter visto por aí, um filme sobre a “ditadura da beleza”, presente não só no mundo da moda, mas em toda a cultura ocidental. Mas eu penso um pouco diferente sobre o que li por aí, em relação à “mensagem” do filme. Não acho um filme “feminista”, mesmo que os principais personagens sejam mulheres e os homens são uns bocós que não podem ver uma mulher bonita. Também não acho “misógino”, retratando como as mulheres fazem de tudo para ficarem bonitas para os homens. O filme não fala nada sobre isso. Ele fala mais sobre como o ser humano (homem ou mulher) é fraco e se dobra à beleza que vê diante de seus olhos. Como não estamos satisfeitos com nossos corpos e invejamos o próximo, numa busca sem sentido pelo sucesso e pela perfeição.

Ouso dizer que o filme é quase uma pregação cristã, por baixo de uma estética contemporânea, e história “aparentemente” polêmica. É como pegar um folheto dizendo “não deixe o demônio da luxúria dominar sua vida, não se entregue aos prazeres da carne e a concupiscência dos olhos e desejos”. Até o anjo mais puro pode ser tomado pelo maligno, se der ouvidos ao ego e aos desejos mundanos! Parece pregação? Nada a ver? Me diga depois de ver o filme.

Também acho que o diretor ironiza Hollywood, mostrando uma Los Angeles que pode te devorar num piscar de olhos e que somente o que é bonito vende. Mas não viaje sobre “imperialismo americano e capitalismo”, como já li por aí. Nada disso, o filme fala sobre pessoas, não sobre sistemas econômicos e políticos.

É um bom filme, gostei muito. Mas reconheço que é para poucos, para quem consegue ver o filme “de fora da caixinha”, mesmo que seja uma caixinha pseudo-intelectualoide. As cenas “polêmicas e bizarras” como contam por aí, que causam repulsa, nem são tão repulsivas assim, para falar a verdade. Filmes de Pasolini, dos anos 70, são graficamente mais repulsivos e você sabe que o cara era um gênio! =P


[ A PARTIR DAQUI, SPOILERS]