Antes de começar esse artigo eu quero deixar um agradecimento para o nosso Flávio de Almeida (AKA The Oz) pela checagem de informação sobre a publicação de AKIRA no Brasil***
1982
O Japão é um dos países que mais contribuíram para cultura do
Cyberpunk. O país é notoriamente conhecido pela sua relação íntima com a
tecnologia e pelo trauma causado pelo ataque nuclear que sofreu no fim da Segunda Guerra Mundial. A sua recuperação depois da guerra foi marcada pelo
rápido desenvolvimento industrial e tecnológico. Essa relação da sociedade
japonesa com esta revolução tecnológica e social foi bastante explorada nas
artes em casamento perfeito com o subgênero.
Como foi dito pelo Guilherme Colichini na primeira parte do especial, o
Cyberpunk surgiu com força no ano de 1982 com o filme Blade Runner, seguindo do
conto Cyberpunk de Bruce Bethke em 1983 e o livro Neuromancer de William Gibson
em 1984. No mesmo período, o Japão também começou sua exploração no subgênero
com algumas obras que entrariam para história e que continuam influenciando até
o hoje.
No mesmo ano de 1982, temos duas obras que serviram como um Boom para o
subgênero no país; O filme Burst City (Bakuretsu Toshi Bāsuto Shiti), dirigido
por Sogo Ishii. O filme tem duas linhas de narrativa dividias por interlúdios
musicais, iterações de alguns personagens e comentários sobre aquele mundo
ficcional. Às duas linhas narrativas convergem para uma só no final da trama. Na
primeira, acompanhamos moradores de uma Tóquio de um futuro distópico que se
rebelam contra a construção de uma usina de energia nuclear. Na segunda, temos
dois amigos que estão caçando um assassino pelas ruas de Tóquio. As tramas se
juntam quando o empresário que está por trás da construção da usina é o
assassino que os protagonistas da segunda trama estão procurando.
O filme foi muito bem recebido pelos críticos da época. Seu estilo de narrativa
moderno e apoiado musicalmente com o punk quera muito popular na época, tanto como na linguagem como na
estética, foram considerados com o ponto de início do cinema contemporâneo
japonês, servindo de influência para outros filmes como Death Powder, Testuo:
The Iron Man, 964 Pinocchio e Rubber’s Lover.
E a segunda obra Cyberpunk daquele ano era nada mais que o mangá AKIRA!
AKIRA!
Assim como o início da própria obra, AKIRA “explodiu” de vez o Cyberpunk na
cultura japonesa. Criado por Katsuhiro Otomo, AKIRA foi série publicada
originalmente na revista Young Magazine de 1982 até 1990. No formato Tankōbon, que são volumes fechados fora de uma revista regular) ela foi republicada pela Kodansha entre
1984 e 1991. O mangá se passa em um Japão pós-apocalíptico e futurístico,
precisamente na cidade de Neo-Tokyo em 2019, trinta anos após uma explosão que
destruiu a cidade e jogou o mundo em uma Terceira Guerra Mundial. A história é
focada em uma gangue de motociclistas adolescentes liderados pelo jovem Kaneda,
uma jovem militante revolucionária chamada Kei, um trio de crianças com dons
extra-sensoriais e o coronel Shikishima, líder militar da cidade de Neo-Tokyo
que acaba apreendendo o jovem Tetsuo, melhor amigo de Kaneda. Tetsuo parece ter
habilidades extra-sensoriais de outro jovem importante para a história: AKIRA!
Akira é o responsável pela explosão que jogou o mundo para
mais um conflito em 1988. Parte de um experimento secreto do governo japonês,
Akira perdeu o controle de seus poderes. Sua identidade foi mantida como
segredo de estado por muitos anos até que sua existência foi vazada para o
grande público, gerando grande estabilidade política, chegando ao ponto de
surgir um culto em sua homenagem. Muitos acham que ele voltará para destruir
mais uma vez a cidade e “purificar” mais uma vez a sociedade. Tetsuo começa a trilhar
um caminho parecido ao de Akira e logo é confundindo com o próprio. É questão
de tempo para a história se repetir, mas seu amigo Kaneda fará de tudo para
salvar ele das mãos do governo... e de si próprio.
Através dos volumes o autor usa muito vários temas do Cyberpunk como corrupção,
isolamento social, poder, governos corruptos e suas experiências secretas que
colocam a sociedade em perigo. É uma série teve muito sucesso mundialmente. Nos
EUA ela foi publicada pela MARVEL COMICS no seu selo separado chamado Epic
Comics (1982-1996), em cores e com o sistema de leitura ocidental. Esse mesmo material americano foi publicado aqui no Brasil pela Editora Globo em 1990. A única diferença é que as
capas eram redesenhadas e coloridas pelo dinamarquês radicado no Brasil, Kim
Oluf. Infelizmente, a série foi bem irregular por aqui, já que teve pouca
divulgação e ainda teve sua publicação interrompida em 1993 graças a um hiato.
Na época que Marvel fechou um contrato com a Kodasha, a série ainda não havia
sido terminada. Com o sucesso do longa-metragem animado e a produção de outros
materiais de marketing, a produção mangá estava parada, fazendo com que a Marvel não
tivesse mais material para ser publicado nos EUA, consequentemente atrasando a
vinda para o Brasil também. Só em 1997 nós tivemos a volta do AKIRA e seu
encerramento oficial na edição #38. Em 2017 a editora JBC lançou AKIRA no
Brasil em formato de 6 volumes, finalmente dando um tratamento especial que
essa obra tanto merece.
Versão em volumes também publicada aqui no Brasil |
Mas é claro que não podemos esquecer do longa-metragem de 1998 que é um divisor
de águas tanto no subgênero do Cyberpunk quanto para os animes em si. A
animação não aborda toda a obra do anime, mas consegue ser bem competente com o
material que é adaptado. O filme foi um sucesso mundial. Com um estilo de
animação primorosa e extremamente bem trabalhada, o filme foi composto de cerca
de 172.000 frames. Frames que frequentemente precisaram serem animados mais uma vez em várias camadas
diferentes para dar uma sensação de dinamismo e velocidade que nenhuma animação
tinha visto até então. Até hoje é considerada uma das maiores obras da história
da animação. O filme usa bem a temática adulta do mangá e sua estética
Cyberpunk, colocando-o no mesmo patamar de Blade Runner, Neuromancer e Matrix
como obras primordiais do subgênero. Ele ainda foi responsável por abrir às
portas para a cultura do anime em vários países, incluindo os EUA onde foi uma
febre no VHS no começo dos anos 90. Aqui no Brasil o filme chegou em 1991,
tanto no VHS como no Cinema, e ainda teve algumas exibições na TV aberta pela
Band, e na fechada no extinto canal Locomotion.
A Explosão que Gerou um Novo “Universo”
AKIRA gerou uma explosão de outras obras de Cyberpunk em diferentes áreas.
Mangás, OVA’s e animes surgiram em grande quantidade no fim dos anos 80 e ao
decorrer dos anos 90. Séries como Bubblegum Crisis, A.D. Police, Armitage III,
Appleseed e Blame! Todos fortemente influenciados pelos temas do Cyberpunk.
Futuros distópicos, governos corruptos e com sociedades altamente modificadas
pelo uso de novas tecnologias.
Uma das maiores obras que surgiram deste boom foi GHOST IN THE SHELL de
Masamune Shirow. Tanto no mangá como na clássica animação, acompanhamos as
aventuras dos agentes da Public Security Section 9, uma força-tarefa composta
por oficiais militares detetives policiais que são responsáveis em combater
cyber-criminosos. Neste possível futuro, a tecnologia avançou tanto que já
comum ver humanos substituindo várias partes de seu corpo por tecnologias que
“melhoram” o seu dia-a-dia, entre elas os cérebros que se conectam com redes,
tornando-os em verdadeiros Cyborgs. A heroína da história, Major Motoko
Kusanagi, é uma Cyborg que teve um acidente quando era criança, fazendo com que
ela precisasse desse tipo de tecnologia. Entretanto, esse tipo de tecnologia
avançada abre uma janela para que criminosos atuem de forma perigosa. Vários
Hackers conseguem invadir cérebros estes cérebros cibernéticos.
O mangá lida muito bem com esta questão da automatização do ser humanos. Até
que ponto ainda somos humanos com todas estas modificações? Ainda temos um
“Fantasma” dentro destas “conchas eletrônicas”? O autor coloca várias notas de
rodapé e explicações detalhadas para o leitor entender como as diferenças
sociais e os avanços tecnológicos que são apresentados na trama funcionam. E em
muitos momentos temos até pequenas discussões filosóficas sobre o que está
sendo apresentado no material.
Edição brasileira com as famosas notas de rodapé do Shirow |
A animação de 1995 é um outro marco para o subgênero. Ela explora muito bem as
questões do mangá, mas em uma forma contemplativa e um ritmo raramente visto
neste tipo de obra. A franquia ainda teve várias séries, OVA’s, jogos e uma
adaptação em live action bem duvidosa por parte de Hollywood em 2017. Adaptação
que sofreu várias críticas por escalar Scarlett Johansson como a Major. Este
ano a franquia ganhou mais uma série animada para o Netflix. Aqui no Brasil você pode conseguir os mangás pela editora JBC.
ALITA e o ressurgimento de Gunnm para o Ocidente
Recentemente tivemos uma adaptação por Hollywood de um desses expoentes do
Cyberpunk japonês dos anos 90, ALITA: Battle Angel (Alita: Anjo de Combate). O
live action adapta muito bem o mangá de Yukito Kishiro, conhecido no Japão como
Gunnm, e o OVA de 1993, Gunnm: Battle Angel Alita de 1993. A história se passa em
um cenário pós-apocalíptico ao estilo de Mad Max em que uma cidade flutuante
chamada Zalem flutua no céu e em que há cyborgs e humanos convivendo. Nessa
situação, o engenheiro cibernético Daisuke Ido encontra no depósito de lixo da
Cidade da Sucata (Scrapintown), a qual fica abaixo de Zalem, um tronco de uma cyborg
inerte e a leva para a sua oficina onde religa a mesma.
Ao acordar, a cyborg não tem qualquer recordação de sua vida anterior e nem do seu próprio nome, fato este que leva Daisuke Ido a dar-lhe o nome de seu gato de estimação falecido, Gally, e a reconstruir o seu corpo para que pudesse cria-la como sua filha (No live action o nome vem da filha de Ido, Alita). Mas com o passar do tempo, Gally descobre-se com habilidades de luta incomuns presentes em seu subconsciente além de uma vontade inata para combater, ela decide seguir a carreira alternativa de Ido como caçadora de recompensas. Aos poucos ela vai se relembrando de seu passado como combatente em uma guerra que ocorreu há 300 anos. Mais uma vez podemos um futuro pessimista e fruto de um confronto sem precedentes. Um futuro onde modificações tecnológicas são normais e fazem parte da dinâmica social.
A adaptação em live action foi uma ótima surpresa e trouxe
de volta o interesse do grande público para o subgênero. Este projeto levou vários anos para conseguir ser produzido. James Cameron (O Exterminador do Futuro, Titanic e Avatar) sempre foi muito fã do mangá e tentou por vários anos dirigir o filme, mas sua agenda complicada sempre o impediu. Só na última década que seu colega Robert Rodrigues (Um Drink no Inferno e Sin City) conseguiu convencer Cameron a deixar ele dirigir o seu tão sonhado projeto. Claro, o sucesso do filme não é nada comparado
com o fenômeno MATRIX nos anos 2000 mas já mostra que o Cybperpunk continua
mais vivo do que nunca. No mangá ainda existem uma continuação chamada Battle Angel Alita: Last Order. Ambos podem serem encontradas aqui no Brasil pela editora JBC em volumes ou digitalmente.
Ao acordar, a cyborg não tem qualquer recordação de sua vida anterior e nem do seu próprio nome, fato este que leva Daisuke Ido a dar-lhe o nome de seu gato de estimação falecido, Gally, e a reconstruir o seu corpo para que pudesse cria-la como sua filha (No live action o nome vem da filha de Ido, Alita). Mas com o passar do tempo, Gally descobre-se com habilidades de luta incomuns presentes em seu subconsciente além de uma vontade inata para combater, ela decide seguir a carreira alternativa de Ido como caçadora de recompensas. Aos poucos ela vai se relembrando de seu passado como combatente em uma guerra que ocorreu há 300 anos. Mais uma vez podemos um futuro pessimista e fruto de um confronto sem precedentes. Um futuro onde modificações tecnológicas são normais e fazem parte da dinâmica social.
Battle Angel Alita: Last Order |
Futuro
Curiosamente o Japão não apresentou grandes obras neste subgênero após 1997. Blame! teve boa aceitação, mas não em um nível de AKIRA ou Ghost in the Shell. Nos últimos os games tiveram um papel maior na criação de novas obras de Cyberpunk no Japão. Séries como Deus Ex pela Square Enix. NieR Automata pela PlatinumGames e Death Stranding pela Kojima Productions.
Embora tenham feito um certo sucesso com a comunidade game, mas nada muito comparado com o que aconteceu no começo dos anos 90. Isso é estranho, já que o país passou uma estagnação econômica entre 1991 e 2001 (A chamada DÉCADA PERDIDA). Por lógica, deveríamos ver mais obras de Cyberpunk refletindo esta situação, mas não foi o que aconteceu. Mesmo com esta escassez de material, o Cyberpunk japonês segue influenciando o “lado ocidental”. Outro país asiático que pode assumir um papel mais proeminente no subgênero é China. Claro, isso se o próprio regime fechado do país permitir. O país literalmente vive em uma situação cyberpunk. O sistema de crédito social tem vigilância por várias partes do país. Muita informação é censurada, mas mesmo assim os cidadões do país ainda vivem uma revolução tecnológica jamais vista nas últimas décadas.
Mesmo com o Japão não tão atuante no subgênero, ainda veremos os próximos anos sua influência em obras ocidentais. Em 2021 eremos mais um capítulo da franquia MATRIX nos cinemas, e podemos esperar mais referências do Cyberpunk japônes nesta produção. E claro, vamos ver muita coisa deles no novo jogo da CD RED Projekt: CYBERPUNK 2077 em Novembro.
Deus Ex: Mankind Divided |
NieR: Automata |
Death Stranding |
Embora tenham feito um certo sucesso com a comunidade game, mas nada muito comparado com o que aconteceu no começo dos anos 90. Isso é estranho, já que o país passou uma estagnação econômica entre 1991 e 2001 (A chamada DÉCADA PERDIDA). Por lógica, deveríamos ver mais obras de Cyberpunk refletindo esta situação, mas não foi o que aconteceu. Mesmo com esta escassez de material, o Cyberpunk japonês segue influenciando o “lado ocidental”. Outro país asiático que pode assumir um papel mais proeminente no subgênero é China. Claro, isso se o próprio regime fechado do país permitir. O país literalmente vive em uma situação cyberpunk. O sistema de crédito social tem vigilância por várias partes do país. Muita informação é censurada, mas mesmo assim os cidadões do país ainda vivem uma revolução tecnológica jamais vista nas últimas décadas.
Mesmo com o Japão não tão atuante no subgênero, ainda veremos os próximos anos sua influência em obras ocidentais. Em 2021 eremos mais um capítulo da franquia MATRIX nos cinemas, e podemos esperar mais referências do Cyberpunk japônes nesta produção. E claro, vamos ver muita coisa deles no novo jogo da CD RED Projekt: CYBERPUNK 2077 em Novembro.
Na próxima parte do nosso especial nós iremos recomendar várias obras de Cyberpunk para você poder ir aquecendo para o lançamento de Cyberpunk 2077. Fiquem ligados!
Leia também a PARTE 1 do nosso especial Cyberpunk!
Leia também a PARTE 1 do nosso especial Cyberpunk!
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